Primeiro - O Hotel da Lapa.
Tem uma carta de almofadas para o hóspede escolher com base no seu tipo de sono. Respect. E se é bom para o príncipe Carlos de Inglaterra, Jorge Bush (o capaz), Catherine Deneuve, Robert De Niro, Colin Farrell, John Malkovich, Monica Bellucci, Tina Tuner, Heidi Klum, Robin Williams, U2, The Queen, Sting, Paul McCartney, Bon Jovi, é bom para mim. Neste ponto estamos conversados.
Segundo - O Restaurante do Hotel da Lapa.
Pela primeira vez na minha vida achei que a Lapa é o meu marisco de eleição. Agarra-se às coisas com tamanha tenacidade que tirá-la é um caso sério.
Assim se comportou esta "Lapa" em mim. Não vai largar o meu palato (e eu não quero que largue) durante muitas semanas.
Um restaurante de nicho é isto mesmo. Um permanente "UAU! Factor" na experiência degustativa. Faltou alguma narrativa histórica que pudesse potenciar e enriquecer ainda mais essa experiência. Mas percebo que conceitos mais teatrais, tipo sory telling à medida que evoluimos na refeição, muito em voga em restaurantes de autor, talvez não resultasse aqui, onde existe algo mais clássico, alinhado com o hotel. O típico serviço à francesa, bem fardado, formal e com uma reverência para os comensais quase aristocrática.
Não vos vou abrir muito a caixa de surpresas porque são muitas, mas quero destacar alguns sabores, texturas, ingredientes e abordagens que me tiraram do sério:
PELA TÉCNICA - Gema e clara de ovo esferizadas.
Imaginem o ovo cozido mas em tamanho XXS semelhante àquelas massas cuscus que se põem na canja. Clara e gema saem do ovo diretamente para uma seringa que injeta líquidos para uma placa com dezenas de pequenos buracos em círculo. Quando caem, clara e gema são recebidas de braços abertos por um confitado (óleo a ferver) que as faz solidificar de imediato na forma de esfera. Na boca tornam-se leves e tal como as petazetas (quem não se lembra do festival de explosões na boca), apetece trincar para sentir um ligeiro estalo. Um capricho do chefe que resultou as mil maravilhas salteado com espargos verdes, cenoura baby e aipo.
PELA CRIATIVIDADE - Lulas recheadas.
Com Bacon? Normal. Com arroz? Comum. Com chouriço, azeitonas e cebola cortadinhos? Só a minha Mãe as fazia e ninguém as fazia melhor. Saudosismo. Nenhuma das anteriores. Com migas. Bem cremosas e com sabor regional. Para as escudar, o chef Helder Santos escolheu um puré de Rábano e adornou com salicórnia e espuma de coentros.
PELA INTERPRETAÇÃO - Leitão de Porco preto confitado a baixa temperatura.
E que confitado... 6 horas de bronze no forno em que o leitão é, a determinada altura, vazado da sua carne, ficando a pele a cozinhar. Depois a carne volta a ser colocada na pele que, nessa fase, já se avizinha estar próxima de uma grande batata pála-pála. Depois disso ainda vai mais 2 horas ao forno. A carne fica macia e com os seus sucos salvaguardados. A pele? Uma ode ao colesterol e aos triglicetidos mas que não me canso de ouvir. Neste caso de comer. A pele está crocante e, entre a pele e a carne, há aquela camada de gordura fininha, quase imperceptível, que amanteigou com o calor e emulsiona a carne e pele quando são levadas à boca em simultâneo. Bendito Helder Santos que tantas alegrias me proporcionou...
PELA CONSTRUÇÃO - Esfera de chocolate de leite com mousse de avelã, suspiro e uma espécie de chocolate fugee que lhe dava um areado no acabamento. Na ponta da esfera de chocolate pendia uma lamela de ouro comestível numa construção em espiral que o melhor é olharem para a imagem. São 1.000 palavras.
No final, um café com mignardises (pequena doçaria como bombons, macarrons ou trufas) da autoria do chefe.
A excelência não é barata. E senão puderem agora dar-se a este pequeno luxo, vão juntando umas notas que não se vão arrepender de escavacar o mealheiro por uma refeição assim (ronda os 100 euros por pessoa, com vinhos).
Porque adiar a recompensa aumenta a motivação, como diria Freud...
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