Em minha casa, quem me lembro de cozinhar mais vezes era o meu pai. Já passou algum tempo, mas as memórias que tenho são essas. E da minha mãe lembro-me de pratos mais “especiais”, como a massada de peixe ou o bolo de bolacha. Coisas que agora como em restaurantes e me sabem sempre a pouco, quando comparadas com o que a minha mãe fazia.
Ora, isto não invalida que, quando ouço o termo “comida da mãe”, assuma que se trata mesmo só de comida da mãe. Para mim, trata-se de comida caseira, honesta, simples, genuína. Aquilo que internacionalmente agora se chama de “confort food”. Que é exactamente aquilo que o Mãe – Cozinha com Amor promete.
A ideia base não é propriamente nova (há imensos restaurantes à apregoar a dita comida de conforto), mas aqui há um enquadramento mais engraçado: a ementa é constituída de pratos típicos das mães de cada um dos 3 donos.Além disso, todas as peças vintage que servem de decoração do espaço vêm das casas dessas respectivas mães. Ou seja, há aqui uma história a suportar o nome do restaurante.
Uma história que, na nossa opinião, devia ser explicada a quem se senta na mesa. A nós só nos explicam no fim, quando perguntamos. Mas faria muito mais sentido no início.
Seguindo ainda esta lógica da “comida de conforto” – ou “comida da mãe”, se preferirem – o primeiro impacto ao entrar no restaurante não é o melhor. A sala é demasiado grande, com pouca decoração, iluminação alta e paredes muito brancas… exactamente o contrário do que esperávamos, tendo em conta o conceito. Mas, e voltando à mesma conversa do final do jantar, percebemos que se trata de um work in progress. Há mais decoração a chegar e já está estudada uma forma de seccionar a sala. Mais do que isso: a enorme parede branca está a começar a ser preenchida com quadros de mães, tanto do staff como dos clientes. Uma excelente ideia que só precisa de tempo para crescer.
Por falar em excelentes ideias, é impossível não falar dos individuais de mesa! Tapados com um prato quando nos sentamos, mas que depois revelam várias frases diferentes em cada um, frases daquelas que todos ouvimos ditas pelas nossas mães, à mesa. Uma brincadeira que resulta muito bem e que ajuda na construção do conceito do restaurante.
Para comer, e numa revista rápida à ementa, temos pratos mais ou menos tradicionais, ainda que com um ou outro toque para se ajustar a novos gostos e tendências. Cada parte da ementa tem um nome “divertido”, seguindo a mesma onda dos trocadilhos.
O prato que mais nos chamou a atenção foi a Sopa da Pedra de Bacalhau, por isso já sabíamos que isso nos ia passar pela mesa. Mas antes pedimos uns clássicos Peixinhos da Horta, bem fritos, só que acompanhados de uma maionese que devia ser um molho tártaro, e a Bruschetta de Abacate e Camarão, que desilude um bocado porque o camarão está quente em cima da pasta de abacate, retirando-lhe a frescura toda. Era uma entrada que eu serviria fria, e que nada tem a ver com qualquer coisa que a minha mãe alguma vez tenha cozinhado.
A Sopa da Pedra de Bacalhau chega então à mesa: um prato com duas postas de bacalhau, um ovo escalfado e uma espécie de pesto de coentros, acompanhado de uma terrina com a sopa da pedra. No fundo, é uma espécie de sopa de Bacalhau à alentejana, mas o caldo é trocado pelo caldo da sopa da pedra. A conjugação de sabores estranha-se ao princípio mas depois começa a fazer sentido. É quase como ter dois pratos num só. E é bom, é realmente comida de conforto.
Do outro lado da mesa, um corte de carne, a Vazia (que nunca comi feita pela minha mãe, e muito menos com esta qualidade). Boa, a carne, servida no ponto. Pena a batata doce que acompanha o prato ser em chips e não em palitos, mas são gostos.
Para terminar a refeição, outra coisa que não me remete para a cozinha dos meus pais, mas que devia ser obrigatória em todos os restaurantes: um pijaminha de sobremesas! A melhor invenção da humanidade!
No Mãe – Cozinha com Amor até dá para escolher quais as sobremesas que queremos incluídas: no nosso caso, um bom Cheesecake de Frutos Vermelhos, os surpreendentes Celeste e Relíquia (doces conventuais da zona de Santarém, baseados em ovos) e ainda um Queijinho do Céu, doce da mesma zona, que foi o melhor dos quatro. Excelente ideia para terminar a refeição.
É verdade que este Mãe – Cozinha com Amor funcionaria melhor se nos fosse explicado o contexto logo à partida. Assim como ficará melhor quando, com o tempo, o espaço for ficando mais acolhedor e a parede com quadros de mães mais preenchida. São tudo pormenores que estão a ser trabalhados, até porque um restaurante não se faz num mês ou dois, é um trabalho de evolução contínua.
Neste caso, há uma ideia de onde querem chegar, o que já é muito mais do que a maioria dos restaurantes novos que vão abrindo. Por isso, há esperança!
Por agora, fica um enorme potencial, uma boa ideia, um prato inesperadamente bom e o belo do pijaminha para terminar. E, claro, uns individuais de mesa maravilhosos!
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