A Casa Davolta deu-me a volta à cabeça!
Visitá-la foi como ir a casa de uma amiga, numa aldeia pacata onde se está só por estar, a fazer coisas tão ativas como olhar as formas que as nuvens fazem no céu ou perceber, pelas folhas das árvores, se o vento está para a esquerda ou para a direita ou ainda para ter aquelas conversas de chacha cheias de reticências...
E como Davolta é dar a volta, esta volta começa pelo fim e a acaba no princípio.
Gostei do Bolo de Cereja e da Pinacolada num registo menos aperaltado que o resto da refeição de 10 pratos que os antecedeu. Só para sentir o prazer de comer por gula e prolongar a estadia. Fresco, vibrante e com uma combinação sexy entre cereja e chocolate. Embora as sobremesas não sejam o ponto forte deste chefe sevilhano.
A presa de porco ibérico teve que ser feita de novo. Aparentemente o chef pediu para dizer que tinha encontrado um nervo no meio da peça e ia fazer outra que fosse mais limpinha . Isto já não se faz... Mas por mim, suculenta e saborosa como estava, podia vir a outra "nervosa" em simultâneo que ambas iam parar ao mesmo sitio. Isto com a barriga de nove pratos anteriores. Acompanhou com um puré de pimentos ligeiramente picantes e alho escurecido, se a memória não me falha. Tenho mesmo que recorrer à memória porque nesta Davolta o menu nunca é igual. Acompanhei a carne com um Valle do Nídeo Reserva Tinto bem encorpado que emparelhou com a carne tal qual Dueto de Rossini.
Os principais de peixe recaíram sobre um pargo e uma pescada. Num extremo, a simplicidade de uma pescada ao vapor, com feijão verde e um molho tipo holandês mas que não consigo precisar de que parte da Holanda... Do outro, um pargo carregado de sabor, com um puré de beringela grelhada que mostrou uma elegância que nunca atribui a este legume, pelos vistos injustamente.
O que me surpreendeu no chef Javier Mendez foi a sua capacidade de trabalhar peixes simples, com simplicidade. E com isso materializar sabores que se mascararam durante anos no meu palato.
Sardinhas ao valor?! Nem vê-las! - Pensava eu. Sardinha é grelhada. Ponto. Estava tão enganado... Quase que consegui saborear o Omega 3 destas Sardinops Sagax que em toda a sua latinidade me fizeram sentir tão português.
O mesmo efeito me fez sentir uma cavala, peixe subvalorizado no preço e que continue assim porque cada vez são mais os chefs que lhe conseguem retirar todo o sabor do corpo e mostrar a insustentável pureza de sabor que lhe corre no sangue.
Mas como não há duas sem 3 vamos lá fazer uma obra de arte de outro dos peixes diminuídos das lotas: o carapau. Dele se faz um excelente sushi, uma excelente grelha e, "vai na Davolta", um fumado com a tal beringela grelhada em puré que me tirou do sério. Toda aquela família popularuxa a começar na Dona Cavala, no Senhor Carapau e na Madame Sardinha ganhou elevado pedigree nas mãos do Javier que agora só há vaidade que eu possa ostentar, em ter cavala e carapau no congelador, prontos para uma refeição de luxo! Fica o desafio de pegar na Miss Sarda ou na Mademoiselle Salema e fazer delas foie gras!
Foie gras esse que apareceu num dueto com camarão em formato de almôndega frita que, embora fosse um sabor que merecesse um cromo na caderneta, não me tocou o sino das notificações. O choco com musseline envolto em pele de moreia era estéticamente bonito mas tambem não surpreendeu, apesar da combinação estar muito equilibrada e com ela conseguir uma das fotos mais bonitas que tirei.
O início da refeição começou com um gaspacho que fugiu aos habituais encarniçados e pintou-se de um laranja torrado cheio de calor cromático e sabor refrescante com o pimento vermelho e o ovo cozido a escudá-lo na perfeição.
De entrada, para compor uma mesa vazia, pedi um Redoma branco só porque em pleno Cascais, quis ter o Douro a meus pés.
Entrei numa casa de família! - Foi o que pensei ao passar o portão baixo de metal e a rampa de calçada de uma moradia com restaurante em baixo e casa de gente de aldeia por cima. Isto promete - concluí. O que se seguirá?
Sinto que a Casa Davolta me vai dar a volta à cabeça!
Fantástico! As ostras fumadas com sorvete de ervas finas, as ostras com raspas de maçã e oloroso, o pargo com mexilhão e para finalizar a sobremesa de café com cheiro - tão boa que não fomos a tempo de a fotografar inteira...
Tudo isto num espaço harmonioso; mesas muito separadas - mesmo antes do Covid a privacidade era já uma regra neste restaurante- um serviço familiar e caloroso é uma banda sonora descontraída.
Tudo bons motivos para voltar à Casa Davolta!
Um dos grandes restaurantes de Portugal. Menu de carta com gostos contemporâneos. Carta de vinhos excelentes, um novo conceito de comida gourmet.
Quando a simpatia e profissionalismo dos proprietários se conjuga com um dom natural para cozinhar e bem receber, o resultado só pode ser este: Fantástico. Todos os pratos são excepcionais mas realço a açorda de crustaceos, diferente de tudo o que se possa imaginar, e que me encheu as medidas. Melhor era difícil. Parabéns
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